Boa tarde turma
Vi está incrivel entrevista do grande Rorion Gracie o pai do UFC e lenda viva do Jiu jitsu
Qual é a sua primeira lembrança do jiu-jitsu?
Estava num auditório e lembro do meu pai lá em cima, de quimono
branco e falando para a audiência. Minha mãe disse: "Vai lá com o papai,
vai". Eu fui andando pelo corredor e me lembro de que era tão pequeno
que o encosto das cadeiras era mais alto do que eu. Eu andei até o
palco, o papai fez uma pequena demonstração comigo e o pessoal gostou.
É sua primeira memória da vida?
Sim, é a primeira memória que eu tenho. Não me lembro de nada antes
disso e nunca vivi sem o jiu-jitsu. Em algumas épocas treinava mais e em
outras menos, mas sempre estive envolvido. Meu pai sempre encorajava os
filhos a ficarem naquela brincadeira de esgrima um com o outro. A ideia
dele era preparar um exercitozinho, treinar um time de pessoas que
pudesse continuar o trabalho iniciado por ele e pelos irmãos.
Isso aconteceu quando você foi morar nos Estados Unidos, em
1978. Lá, enfrentou representantes de outras artes marciais para mostrar
a superioridade do jiu-jitsu. Como foi esse início?
Uma vez, assim que cheguei lá, entrei numa academia de taekwondo. Eu
ainda não tinha academia, nem tinha começado a dar aulas na minha
garagem. Entrei na academia e o professor estava dando aula para 30
alunos. Era o tal Hee Il Cho, conhecidíssimo nos Estados Unidos, capa de
revista, medalha, troféu... Entrei com um amigo meu, e ele estava dando
aula, interrompi e falei: "Meu amigo, eu sou do Brasil. Será que você
não tem interesse que eu dê umas aulas enquanto você não estiver
ensinando? Eu posso dar aulas de jiu-jitsu, fazer um movimento e dividir
contigo o dinheiro". Ele falou que não precisava. Perguntei se ele
sabia o que era jiu-jitsu. Falei que numa luta de verdade ele ia acabar
no chão e o jiu-jitsu ajudava. "Ninguém me leva para o chão", ele disse.
Você se enfrentaram?
Eu perguntei se ele queria experimentar, que o taekwondo dele é bom,
mas não tão bom quanto ele imagina. Fui mudar de roupa, botei o quimono,
voltei e fiquei parado no meio do ringue. Ele veio e deu um chute de
longe que passou perto de mim. Depois, quando deu um passo adiante para
que o próximo chute pegasse em cheio, também dei um passo à frente. Aí
ficou muito curto para ele, levei o cara para o chão e montei. Ele
começou a espernear, botei a mão no pescoço dele e comecei a falar com
os alunos: ''Está vendo, pessoal, se o cara não sabe sair de baixo ele
vai se atrapalhar aqui". Os alunos correram e me arrancaram fora.
E depois?
O mestre pediu outra chance... pensam sempre que é azar. Ele se
arrumou, montei de novo, e um assistente foi na direção de uma barra de
peso. Não sei se ele ia pegar a barra ou não, mas quando ele passou do
meu lado, o derrubei também. Aí o tempo fechou, foi a maior confusão.
Quando fui mudar de roupa, os alunos vieram me perguntar o que era
aquilo. Eu falei: "Gracie Jiu-Jitsu". Eles disseram que não conheciam, e
eu disse que eles ainda iam ouvir falar muito disso.
Esse é o embrião do UFC?
Eu dizia que o jiu-jitsu era melhor e o outro dizia que era a arte
marcial dele. Como é luta, uma hora você acaba brigando para ver quem é o
melhor. Foi assim que nasceu o Ultimate Fighting. Eu comecei a fazer
isso tantas vezes, com karatê, kung-fu, taekwondo, judô, luta livre,
boxe, todo mundo. Os caras vinham, eu ganhava de todo mundo e, como não
dava porrada em ninguém e respeitava todos, eles viravam meus alunos.
Você nunca levou um soco?
Nunca. E nem podia, sou magrinho.
Você nunca pensou em conhecer as outras artes marciais?
Para quê? Como estudo? Eu não preciso, acho o jiu-jitsu melhor.
Mas e o UFC, que nasceu em 1993, como foi colocado em prática?
Um dia caiu a ficha e pensei: por que a gente não faz um evento e
coloca todas as artes marciais na mesma noite e o povo assiste na
televisão? Me juntei ao (empresário) Art Davie, amigo meu. Chegou também
o (cineasta) John Milius, outro amigo, que tinha feito "Connan, o
Bárbaro", e o nomeei diretor criativo. Era uma espécie de marketing.
Foi com John Milius que nasceu o formato do octógono?
Eu já sabia que não queria um ringue de boxe. O cara começa a apanhar
e tenta fugir entre as cordas. Então, tinha que ser uma tela ou um muro
para não fugir. A gente pensou num tanque de jacaré, mas um empurra o
outro e o jacaré come o cara. Pensamos em tubarão também, eram ideias
hollywoodianas, tinha que exagerar. Pensamos em acrílico, mas não ia dar
certo com as luzes refletidas. Chegamos à conclusão que seria uma tela,
que dá a impressão de que é uma jaula. A razão para não ter um ângulo
reto é porque, se o lutador caísse preso num canto, ele seria
prejudicado. Ao deixar mais aberto, não fica preso, tem como escorregar,
dá mobilidade. E foi um sucesso, hoje é o esporte que mais cresce no
mundo.
Por que você escolheu Royce Gracie para lutar no UFC 1, se Rickson Gracie era mais alto e forte?
A escolha foi 100% minha. Achei que seria um bom exemplo mostrar que o magrinho podia ganhar do grande.
Por que você saiu do UFC e vendeu sua parte no negócio?
Quando o Royce lutou com o Dan Severn, no Ultimate 4 (em 1994), a
gente tinha duas horas para transmissão de pay-per-view. A luta ao vivo
durou duas horas e três minutos. Ou seja, a transmissão foi interrompida
sem o pessoal ver o final da luta. Foi a maior confusão. A gente teve
que passar a luta de novo e de graça, teve que reembolsar muita gente e
perdeu muito dinheiro. Meus sócios falaram que teríamos que botar limite
de tempo. Mas eu disse que se botasse tempo de luta afetaria a
psicologia da luta e do lutador.
Qual é a diferença?
Se eu disser que tem um round de cinco minutos, ele se prepara para
cinco minutos. Ele apanha, apanha, apanha, mas sabe que vai acabar. Sem
tempo, muda tudo, é matar ou morrer. Hoje em dia, o cara pega numa chave
de braço, mas toca a buzina e ele tem que soltar. Eu não assisto mais
ao Ultimate Fighting por causa disso. É um show que está crescendo
enormemente, é um espetáculo, mas na minha época era uma briga de
verdade. Hoje não é. Ele perdeu o objetivo inicial que era comparar os
estilos de luta.
E a qualidade e a técnica dos lutadores de hoje?
São atletas excepcionais. Cada um é especialista em sua área. O que
eu queria aconteceu. O mundo inteiro se conscientizou da importância do
jiu-jitsu brasileiro. Hoje quem quiser subir num octógono e não souber
jiu-jitsu nem entra. Adoro saber que eu sou o pai da criança... só que
(o UFC) enveredou para um lado que não mais atende à minha visão
inicial.
O UFC vale mais de US$ 1 bilhão atualmente. Você não lamenta as perdas financeiras?
Se ficasse no Ultimate só por causa do dinheiro e fosse contra a
minha crença, eu estaria me prostituindo. Não acredito mais no negócio
do jeito que é. Hoje quem ganha o Ultimate nem sempre é o melhor
lutador. Ele pode cair numa chave de braço e ser salvo pelo gongo.
Depois, foge em pé, dá um soco, um pontapé e ganha por pontos.
Quem é hoje o melhor lutador de MMA do mundo?
O melhor lutador é o que está usando as regras da melhor maneira
possível. Então, o Anderson Silva estava fazendo um negócio bem-feito.
Esses caras que estão ganhando estão merecendo ganhar. Aprendem o
jiu-jitsu, o karatê, o taekwondo, o muay thai, o que for. E usam a
regra, usam o tempo, estão em ótimas condições físicas. Enfim, fazem um
negócio bem-feito.
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